quarta-feira, 21 de setembro de 2011

em construção

É que não posso mais fugir das palavras. Elas andam me cercando em cada experiência simples que vivo; ficaram por ali, me rodeando com a sua singeleza de quem sabe chegar e me paqueram, me seduzem...até que e não sou mais capaz de resistir e me deixo desfalecer em seus braços lânguidos, limpos.

Toda vez que isso acontece, há um cumulativo de sensações guardadas, desesperadas pra sair, mas que ainda não amadureceram de vez. Então, o receio. Receio de sacar a folha em branco e vontade de manter sua integridade sem acrescentar um risco sequer. O que não canso de aprender é o quão inevitáveis são os planos de Deus. Faça eu os passeios que fizer, conheça os caminhos que eu julgue corretos – são sempre desvios para um destino final.

E é por isso que não posso deixar de registrar todas as maravilhas, que docemente foram concedidas a mim.

São as bolas murchas penduradas à janela da cozinha que estão ali para lembrar o festejo alegre de vida e juventude do meu velho. Com a festa, os sorrisos e tudo o que eles implicam. Havia que se arranjar um pretexto para a reunião de gente estimada num pedaço de metro quadrado, que agora era maior e que precisava fazer-se conhecido. Pois os chapéus rubro-negros estavam ali para provar que a alegria habita essa casa. E não apenas no "muitas felicidades, muitos anos de vida" – também lá, mas na índia recém-pintada e emoldurada, no pavê de pobre e no forró sobre o azulejo.
E permaneceu a alegria até a semana seguinte – tendo feito intervalo nos stresses pré-traumáticos de um projeto. Que coisa bonita ver o meu amigo prostrado diante da cruz do nosso Senhor. Que alegria ao ver um novo (quase) sacerdote, a postos para a missão que Deus lhe confiou. Fez-me lembrar o quão preciosas são as vocações e como é importante orar por elas. Tamanha irradiação percorria meu corpo trinta vezes a cada milésimo de segundo e eu não sabia explicar (que pretensiosa eu, querendo explicar os dons do Espírito).

Certo é que vieram as alegrias. E ali permaneceram e modificaram a vida em mim. E permanecem. E eu não preciso mais escrever.

em 15/08/11

domingo, 26 de junho de 2011

prelúdio

há muitas palavras
neste silêncio metafísico:
eterno,
de certezas e verdades

ólá
e não é preciso mais
chegamos como quem chega
à lua
lentos e vislumbrados

e como se não bastasse
tanta música e pausa tanta
o encontro nos encontra
arrebata-nos e permanece

"renda-se", disseste
como negar o pedido
de um olhar extasiado?

fico, não calo, adormeço
pois é mar dentro de mim
que insiste em rebentar

segunda-feira, 30 de maio de 2011

listen to the music

Ando tendo um distúrbio que, de tão constante, merece uma digivolução conceitual: fones de ouvido.

A função do benedito é a aquela que os nossos amigos (?) funkeiros desconhecem: particularizar o som. Tenho lá as minhas teorias fajutas sobre os prós e contras dessa funcionalidade, já que ela , apesar de benéfica em sua grande parte, acaba prejudicando as relações humanas.

Mas a discussão não é essa. Acontece que, os estéreos estão lá, nos meus ouvidos, enfiados na concavidade orelhudística, ou transpassando a juba e me fazendo carinho com a espuma, quando, de repente...percebo não estar escutando nada. Isso mesmo, meus camaradas. Eu, aquela menina cabeluda, que tanto gosta de música, simplesmente sofre um lapso de existência e pára de utilizar a coisa como deveria ser.

Deixe-me explicar.

Quando eu retiro o portátil e perco um tempo desenrolando os fios, a intenção é aquela, nobre, que todos conhecemos e concordamos. Aperto o play, seja ele do meu celular ou da minha tela LCD (infelizmente eu não possuo um ipod, só um mp4 com uma mancha laranja na tela, no formato de um chafariz, que não me permite “ver” o que eu estou ouvindo), e inicio a apreciação ou alienação musical como todo bom ouvinte. É quando acontece. E eu não sei a que horas, à que altura da estrada, em que pesquisa ou conversa no facebook eu estava quando a playlist acaba. Quando dou-me conta, o objeto está lá, inutilizado, estranho, há não sei quanto tempo.

Vim aqui pra externar a coisa, por causa da repetição desse acontecimento. E, de recorrente, me dispus a analisar. Eis que sofri a epifania. Atribuí uma nova utilidade ao brinquedinho (agora posso chamá-lo do que eu quiser). Eu preferi definir isso como apego.

O fato de estar com o fone quieto arressoando nos tímpanos, não significa, necessariamente, a interrupção do som. Já diria Wisnik - arrebatando meus sentidos -, que o ruído é som; silêncio é música. E na quietude plena e engraçada da não-música na cabeça, cria-se espaço pra escuta universal da música no ambiente. E what an experience a descoberta de um mundo harmônico.

O apego, refere-se a, tendo descoberto isso em mim, precisar do fone para reviver a sensação. É claro, depois que percebi o acontecimento, passei a prestar atenção.

A última vez que me lembro, deu-se noite passada. Estava eu, marota, navegando, como uma boa e alfabetizada cibercidadã que sou, quando, BANG: fones silenciosos. Ok, hora de curtir a descoberta. Cooler do computador, cigarras, caminhão do lixo, cachorros latindo e gemidos.

Gemidos? Deparo-me com mãe e pai (calma, leiam o resto da história) dormindo (ufa), com a TV ligada no Mulstishow. Hora do soft porn. Levei um susto, mas logo entendi que já dormiam na frente da televisão muito antes da sacanagem começar. A minha mãe acorda confusa e dispara um “o que é isso, meu Deus?” que me faz rir. Desliga o aparelho. O silêncio-música aumenta, aumenta...até que me atordoa.

Então, eu me rendo. Abro a pasta mais próxima e boto pra tocar qualquer coisa.

Preciso de drogas mais pesadas. Preciso dos acordes.

segunda-feira, 11 de abril de 2011

ainda não passou, mas vai passar.

O subjetivo impera em quase todas as partes do processo. A inteligência emocional toma o lugar de todos os sentidos humanos conhecidos e nos torna dementes, doentes, dependentes... O apogeu da afetividade faz-nos sentir seres elevados, agraciados, onde nada, nem ninguém é capaz de compreender tamanha devoção. Tal entrega, dá a sensação de imortalidade, super-heroísmo, obra-prima. É riso, canto, louvação. É brilho, paz e eternidade! Até que...tudo desmorona. E não há nada escrito que comprove a promessa secreta que fizeram um ao outro. Não tem choro que convença. Não tem foto que mistifique. Não há relógio que manipule o tempo. É um desmembramento forçado e radical. Dói uma dor entranhada de gosto amargo na boca e nó na garganta que não se move, só se desfaz em pranto. Dá vontade de rasgar o peito e deixar sair essa coisa estranha e sem forma que se alojou. Dá vontade de matar quem esqueceu de contar que ia ser horrível. Dá vontade de se jogar do precipício só pra ver o que acontece. E a impossibilidade de tudo isso rompe ainda mais em dor. Deveria haver um contrato. Tudo objetivo, claro e organizado. Cláusula primeira: Fica acordado que ambas as partes prometem cuidar da felicidade um do outro; felicidade essa sem fim ou pausa. Cláusula segunda: É proibido o ciúme, a insegurança e a não-resolução. Parágrafo único: É vetada a promoção do sofrimento, de qualquer natureza, gênero ou grau e em qualquer momento. Concordemos, tudo seria mais fácil. Por favor, quando esse mundo existir, retirem a palavra "saudade" do dicionário. Até lá, eu dou um jeito de me recompor. Afinal, o que me resta sou eu. E assino em baixo.

sexta-feira, 25 de março de 2011

Tudo certo, como dois e dois são cinco.



Não concentro-me. Imagino ser o motivo um único copo de água que ingeri no dia. Queria que o fosse. Não posso render-me à vil aceitação do fatos. Pois fato é que as mudanças estão ocorrendo, bem na frente de meu nariz, com a ligeireza de uma formiga cansada da labuta, apressada para bater o ponto. É a casa 6, com seus inúmeros segredos e manchas de esmalte no chão, que não mais me pertence e um tabernáculo de idéais que insiste em se profanar.
Tinha que ater-me às considerações banais. Nas considerações banais, habita toda a frivolidade e maciez. Era disso que precisava. Uma boa dose de teatralidade, creme de cabelo e House. Uma cerveja gelada contém a quantidade substancial necessária para suprir um dia insoso. É tão bom pairar sobre uma conversa confortável sobre o tempo, sexo ou televisão. Permiti ao meu ego elogios alheios e confissões passageiras.
Mas, não adianta. Não há jeito fácil de escapar do cabelo ressecado, do xixi concentrado, da monotonia parada ao lado e do ócio latente. Dá pra escapar encarando. E, apesar de encarar um rosto cheio de orelhas no espelho ser tarefa torturante, eu sou mulher o suficiente pra quebrar o vidro ou ignorá-lo, feito macho.
Queria comer mil maçãs, pra encher meu estômago de "ácido" e enganar a fome, de cinco em cinco minutos, mas a praticidade não resulta na satisfação e sim, mais estatiticamente, na frustação. Por isso, prefiro cozinhar meu feijão fora da validade e correr os ricos de um estômago pesado.
É melhor assim. Fugir da insônia nada mais é do que acovardar-se num sono mentirinha. Escolhi brincar com ela, dizendo: "olha, eu sei escrever!"
E por aí, entre noites mal dormidas e risos forçados, eu vou compondo uma melodia. Mesmo. Qualquer hora eu mostro pra vocês. Nessas situações, cantar é meu melhor remédio, ainda que meu passarinho ande tão calado...

E chega de lamentações. Reclamar é muito chato!
Eu sou feliz pra cacete!

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

Criatura

Teia de nylon, de seda ou brim
Sou eu quem decido o fio
Que tecerá a minha vida sem fim

E se enfim me deter
Na armadilha que criei
Inveto um jeito de gostar
De ter prazer e me render

Pois não há fácil maneira
De fazer santo o pecador
É de sonho e de pó
Cupim devorando o meu andor

Penso e paro
Vou e antecipo
Esperar demora o tempo
Da vontade de um grito

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

O Amazonês

Espia maninho
Eu sou dessas paragens
Das 'banda' de cima
Do lado de cá
Eu não sou leso
Nem tico bodó
Mas boto no toco
Se tu me 'triscá' (marrapá)
Eu não vim no guaramiranga
Sou moleque doido não venha 'frescá'
Pegue logo o beco e saia vazando
Senão numa tapa tu vai 'emborcá'

Me criei na beira ali pelo 'ródo'
Eu me embiocava lá pelos 'motô'
Mamãe me ralhava e eu nas 'carrera', zimpado
Era galho de cuia, lambada e o escambal
Saía vazado pro bodozal, menino vai se 'assiá'
Tira a tuíra do 'côro', que agora é dos vera
Vou te malinar.

Sou amazônes, não nado com boto, nem chupo 'piqui'
Sou do mesmo saco da farinha
Aquela da ovinha ali do uarini
Sou amazônes, num é 'fuleragi'
Eu sou bem dali e dou de 'cum força' na farinha
E sou 'inxirido até o tucupi.

Eu era escarrado e cuspido uma osga
Mas meu apelido era carapanã
Muito apresentado, passando na casca do alho
Era chato no balde, um cuirão pitiú
Mais 'intojado' que 'dismintidura'
Numa gabolice pai d'égua que só, pois num é?!
Man eu era chibata, parente, de rocha
Era o rei do 'migué'

Na ilharga das balsas
Brincava de pira
E ali de 'bubuia', ficava até 'ingilhá'
Mangava 'dusôtro' na esculhambação
E na hora da broca mandava dindin com kikão
Era bom 'qui só'
Eu pegava um boi, que era massa demais
Égua 'su mano', eu cresci à pulso
E hoje vivo dos bicos na rampa dos cais


Nicolas Júnior